20 junho 2007

Testemunho: Aulas de Inglês no Ensino Básico

Comecei a trabalhar muito cedo. Tinha 17 anos e tinha terminado o 9º ano (é verdade, não era uma aluna muito interessada). Corria o ano da graça de 1987. Desde esa altura em que tinha apenas o 9º ano de escolaridade e até à minha licenciatura, tive 4 empregos diferentes. Em todos eles, começava com contratos de 6 meses e, findos esses contratos, passava à efectividade.

Entretanto, os anos foram passando e eu queria evoluir. Voltei à escola. Como à época não havia Novas Oportunidades para ninguém, ingressei no ensino nocturno e fiz o 12º ano, que era o meu objectivo. Foi um percurso por vezes lento, porque fazia muitas horas extraordinárias (apesar de estar efectiva na empresa, vejam lá!!) e entretanto fui construíndo a minha vida pessoal.

Feito o 12º ano com uma média razoável para trabalhadora-estudante (14 valores), não pude ficar-me por aí. Concorri à Faculdade para ver o que dava. O resultado foi que ingressei num Curso Superior. Falei com o meu patrão, uma pessoa com quem já tinha muita confiança (havia já 6 anos que trabalhava na empresa) e combinámos que eu trabalharia em regime de semi part-time, ganhando metado do salário, mas tendo que cumprir todas as minhas responsabilidades, já que era responsável pelos maiores clientes da empresa. Isto implicava fazer muito mais horas extraordinárias que nunca eram pagas. Tudo isto aconteceu sem que o meu contrato fosse alterado ou eu perdesse a efectividade. E garanto que nunca a empresa ficou prejudicada pelo facto de eu ser efectiva.


Finalmente, decidi dedicar-me inteiramente ao Curso e despedi-me da empresa. Enquanto continuava com a minha formação «superior», trabalhei num call center e numa empresa de estudos de mercado, sempre com contratos renováveis.

Tudo mudou quando terminei o curso e procurei trabalho (porque empregos só para filhos de ministros e outros que tais) na minha área de (de)formação. Tenho trabalhado sempre, mas com recibo verde. Sou professora de Inglês nas tão propaladas AEC's Actividades de Enriquecimento Curricular.


Tenho a sorte de ter conseguido, no ano lectivo passado e neste, trabalhar para 2 Câmaras Municipais e para um centro de estudos. Numa Câmara Municipal, tenho contrato e recibo de vencimento, pelo que tenho direito a subsídio de Natal e férias e a pedir subsídio de desemprego. Claro que os valores são tão exíguos, que quase não se notam. Aufiro uma média de 180 euros mensais líquidos por 24 horas de trabalho mensal na escola, o tempo dedicado à preparação de aulas e os dinheiro dispendido com materiais não são contabilizados e se eu faltar por doença, como aconteceu este ano, em que estive de baixa médica, as faltas são consideradas injustificadas. Isto não leva a que eu trabalhe mais, leva é a que eu vá trabalhar doente, contagiando todas as crianças com quem contacto.

Na outra Câmara Municipal passo recibos verdes. Aliás, nem tenho qualquer relação directa com a autarquia, porque há um protocolo de colaboração entre a autarquia e a Faculdade onde fiz a licenciatura. Esta entidade patronal paga-me 200 euros por mês por 12 horas mensais. Apesar de o valor pago à hora ser muito superior ao da outra entidade, aqui tenho que fazer formação online, tenho que assistir a reuniões regulares que me impedem de complementar o parco salário com outros ganhos, tenho que estar sempre disponível porque, de um momento para o outro, surge alguma actividade a que não podemos faltar porque, como me foi dito, assino um contrato em que me comprometo a ir a todas as reuniões marcadas.

A medida que veio oferecer Actividades de Enriquecimento Curricular aos alunos do 1º ciclo permite-nos trabalhar, é certo, mas contribui para que cada vez mais profissionais sejam escravos do recibo verde. Como todos os outros profissionais verdes, não temos quaisquer direitos. Tenho 37 anos e não posso ter filhos porque não posso ficar uns meses sem receber salário. Isso já me acontece nos meses de Verão! As «exorbitâncias» que me pagam não são suficientes para que eu possa depender apenas de mim.

A licenciatura fez-me perder um direitos fundamentais, como são o direito ao trabalho e à dignidade!

Com algum sacrifício fiz uma licenciatura numa faculdade estatal, sempre como estudante-trabalhadora e chego à conclusão de que todo o esforço só serviu para me enriquecer mentalmente, porque, quanto ao resto, só me empobreceu.

Toda a nossa situação só contribui para o empobrecimento do país. Se não temos garantias de trabalho, não podemos contribuir para que a economia do país progrida.


Anónima

1 comentário:

Mentiroso disse...

Ponham-se todos os nomeados políticos e "por confiança" a recibos verdes. Incluindo os que ocupam indevidamente os postos que mudam de mão a cada mudança de governo (nos outros países a maioria das pessoas nem acredita que em Portugal seja assim). Em seguida incluam-se também os políticos. Toda essa corja de parasitas a recibo verde.

Outra solução é expulsar todos os parasitas nomeados da administração pública. Devem andar à volta dos 4000. São 4000 lugares para pessoas formadas e competentes que os obterão por concurso público e que deixarão o desemprego ou o emprego mais que precário.

Já se está farto de ver que blá-blá-blá não move a máfia. Nem ela deseja outra coisa senão que o blá-blá-blá assim continue. Há que passar à acção. Correr com eles de vez e mudar a legislação corrupta que eles fizeram em em que não podem ser responsabilizados nem controlados.